Tendo em vista dar efeito aos princípios gerais constantes dos artigos 15.º n.º 3 e 37.º da Constituição Angolana, os quais reconhecem o direito à propriedade privada e estabelecem que as expropriações só são permitidas quando fundamentadas em razões de interesse público e mediante o pagamento de justa e pronta indemnização, a Assembleia Nacional aprovou a Lei n.º 1/21, de 7 de Janeiro, que aprova a Lei das Expropriações e revoga os diplomas ainda do tempo anterior à independência que regulavam esta matéria.
Com vista a concretizar os princípios fundamentais referidos supra, a Lei da Expropriação estabelece o procedimento específico que rege a expropriação, destacando-se como alguns dos principais aspetos do novo regime legal os seguintes:
- Para além do Estado, podem ainda ser beneficiários da expropriação as Autarquias Locais, bem como qualquer pessoa coletiva pública ou privada;
- Não sendo definido o conceito de utilidade pública, alguns casos de utilidade pública que podem justificar procedimentos de expropriação encontram-se listados na Lei, estando previstos, entre outros, razões de Defesa e Segurança Nacional, a criação de novos glomerados habitacionais, Pólos de Desenvolvimento, Zonas Económicas Especiais e Zonas Francas, aproveitamento industrial de minas e jazidas minerais, de recursos hídricos, exploração de serviços públicos, funcionamento de sistemas de transporte público, construção e montagem de centrais elétricas, subestações e linhas de transmissão integradas no sistema elétrico vinculado, bem como quaisquer outros casos de utilidade pública que venham a ser estabelecidos em legislação especial;
- Sem prejuízo dos casos das expropriações tidas como urgentes, é dada prevalência à aquisição de bens por via do direito privado, o que implica que a autoridade expropriante, antes de solicitar a emissão de uma Declaração de Utilidade Pública a qual, por sua vez, possibilita o recurso ao processo expropriativo, deve procurar chegar a acordo com as partes interessadas, a ser formalizado por meio de escritura pública;
- Sempre que um acordo não for seja possível ou no caso de expropriações urgentes, cabe ao Presidente da República promover a formação do ato expropriativo através da aprovação da Declaração de Utilidade Pública, conferindo-se poderes à entidade expropriante para desencadear o processo expropriativo;
- Após a aprovação e publicação da Declaração de Utilidade Pública no Diário da República deverá ter lugar uma vistoria tendo em vista permitir, nomeadamente, determinar as principais características dos bens a expropriar e fazer uma estimativa do montante da indemnização devida. Os interessados afetados pela expropriação têm o direito de assistir à vistoria e formular perguntas ao perito responsável. Da vistoria deve ser lavrado um auto e posteriormente um relatório, o qual pode ser objeto de reclamação quanto ao seu teor;
- O direito à justa indemnização e o processo expropriativo a ser seguido são assegurados pela Lei das Expropriações, sendo determinadas regras específicas quanto à forma de apuramento do valor da indemnização – devendo a mesmo corresponder ao valor real e corrente dos bens a expropriar, que poderá incluir não só o valor do solo mas também de edificações e benfeitorias que possam existir em momento anterior ao da data da publicação da Declaração de Utilidade Pública –, assim como a tramitação do processo expropriativo, incluindo as formalidades a observar e prazos aplicáveis, e que permite que as partes interessadas possam contestar e discutir o montante da indemnização devida;
- A própria Declaração de Utilidade Pública poderá ser contestada junto dos tribunais, caso em que a matéria em discussão se prenderá com a legalidade da expropriação e dos motivos invocados e já não com a questão do montante da indemnização devido;
- O Presidente da República pode autorizar o beneficiário da expropriação a tomar posse administrativa dos bens em causa, caso em que as obras necessárias para executar o projeto que justifica a expropriação deverão ser iniciadas dentro de um prazo pré-determinado, sob pena de ser devida uma indemnização pelos prejuízos causados em decorrência da referida posse administrativa;
- A declaração de pública utilidade caduca no prazo de 5 anos, no caso de expropriações ordinárias, ou no prazo de 3 anos, no caso das expropriações urgentes, caso as autoridades não promovam a execução do projeto que a origina, sem prejuízo da possibilidade de a mesma ser renovada, uma única vez, por um período de 1 ano;
- A Lei da Expropriação por Utilidade Pública prevê ainda as situações que podem originar uma reversão dos bens expropriados, designadamente nos casos em que as autoridades não conseguem implementar o projeto que motivou a expropriação nos prazos legalmente devidos e/ou nas situações em que cessem as finalidades da expropriação. O exercício do direito de reversão está sujeito a um prazo de caducidade e fica dependente da devolução, pelos expropriados, do montante anteriormente recebido a título de indemnização.
- Encontra-se ainda prevista para os casos de Expropriação Litigiosa a possibilidade de as partes interessadas recorrerem à Arbitragem para fixar o montante da justa e pronta indemnização resultante da expropriação como forma alternativa ao recurso aos tribunais Estaduais.
Um importante conjunto de matérias fica ainda dependente de futura regulamentação, a ser aprovada pelo Presidente da República, nomeadamente as regras específicas relativas à definição do valor dos solos, as regras referentes à lista de peritos responsáveis pela realização das vistorias e relatórios de avaliação, ou a regulamentação referente ao reassentamento de populações afetadas por procedimentos de expropriação.
A Lei da Expropriação por Utilidade Pública entra em vigor em julho de 2021, 180 dias após a data da sua publicação, sendo, porém, desde já aplicada às expropriações em curso, com as devidas adaptações.
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